Soou o sinal
para o recreio e eu fui o primeiro a me por de pé. Deixei a sala de aula as pressas
e me dirigi ao pátio tentando ser um dos primeiros na fila da cantina. No
caminho, encontrei nos corredores o Lauro, grande parceiro de “cabulagem”. Ele
se juntou a mim e começamos a colocar as fofocas em dia quando de repente uma bola
de papel o atingiu na nuca. Uma voz gutural emerge do nada ordenando:
- Não olhe
para trás, pois o bicho vai pegar!
Eu sem
entender o que havia ocorrido, ingenuamente não atendi ao pedido e ao me virar
para trás eis que surge ele, o cara mais temido daquela escola: Cosme. Naquele
instante percebi do que se tratava e pude também em milésimo de segundos notar
o terror nos olhos de quem observava a cena.
- Deu merda! -
Disse um Lauro à beira do desespero.
Continuei andando, mas sem a pressa de antes,
pois minhas pernas já não me obedeciam. Enquanto isso, eu assistia Lauro se
distanciando numa marcha nervosa. Ao chegar à fila, aquela voz voltou a entonar
o medo, agora, quase ao meu ouvido.
- Eu não falei
para não olhar para trás? Você está a fim de ser zuado né?
Repentinamente
ele se colocou a minha frente e me encarou com fogo nos olhos. Nisso as pessoas
foram deixando a fila e fazendo um círculo em nossa volta. Nesse momento percebi
que o medo havia desaparecido subitamente e uma serenidade me tomou por
completo. Sem pensar e com uma força descomunal o empurrei violentamente em
direção da cantina. As costas de Cosme se chocaram contra o balcão ocasionado
além da dor, uma falta de ar que era visível. Ele foi ficando pálido e sua
retumbante voz quase não saia. Restou aos seus comparsas que estavam de plantão,
levá-lo ao banheiro para tentar reanimá-lo. Lauro que presenciava a cena de
longe veio até mim e disse:
- Cara, o que
foi aquilo? Achei que o Cosme ia te quebrar todo! Não esperava que ele fosse amarelar
daquele jeito.
Eu permaneci
ali imóvel por alguns minutos sendo fitado pelos meus novos admiradores,
enquanto tentava entender o ocorrido.
No dia
seguinte, descia eu a viela que era o caminho da escola quando surgiu do nada,
Cosme empunhando um revolver. Dessa vez o medo não me abandonou não. Ajoelhei, implorei,
pedi perdão até que por fim sensibilizei o irredutível Cosme. Compreensivamente
ele me aplicou três coronhadas e um tiro na mão. A partir desse dia, passei a
ser devoto de São Cosme e Damião.
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