terça-feira, 27 de novembro de 2012

AMIGO DO PEITO


- E aí Chico, tudo tranqüilo?
- Meu amigo! Estou feliz demais. Lembra aquele Kadet que eu estava doido pra comprar?
- Sim me lembro - respondi temeroso com o que viria pela frente.
- Pois é cara, comprei ontem. O Geraldo facilitou a forma de pagamento.
Eu não podia acreditar que meu amigo, além de fazer essa besteira de adquirir uma lata velha, ainda por cima comprou a prazo e o pior, ainda estava feliz.
- Só não vou dar uma churrascada lá em casa pra comemorar porque fiquei duro – disse- me o infeliz.
- Fico feliz em saber que você realizou o seu sonho.
- Passa mais tarde lá em casa pra ver a máquina.

 - Pode deixar Chico, daqui a pouco eu vou lá ver.
- Até daqui a pouco.
- Até mais Chico.
Duas horas depois, estava eu presenciando Chico e seu orgulho radiante. Realmente era impressionante o entusiasmo com que ele me apresentava cada detalhe obsoleto daquela “máquina”. Sinceramente, pensei até que Chico estivesse

- Vamos dar uma volta?
- Vamos – aceitei o convite já me arrependendo.
Saímos por aquelas ruas vizinhas com Chico parecendo um penta campeão desfilando em cima do carro do corpo de bombeiro. Não havia uma só pessoa que não tivesse lhe dado os parabéns. Confesso que aquilo já estava me dando nos nervos.
Quando chequei em casa, peguei a chave do meu Corolla e me dirigi até a garagem. Dei uma volta em torno do carro e comecei a observar detalhes que nunca havia dado atenção. Era impressionante como sua pintura reluzia naquela garagem. Passei a mão sobre os pneus e senti os pelos ali praticamente intactos. Entrei em seu interior e senti que o banco estava até mais confortável do que nunca. Dei a partida e com uma brusca acelerada me arrepiei ao ronco suave do motor.
- Isso sim é carro! – falei em voz alta.
No dia seguinte, passei novamente na casa de Chico e lá estava ele, encerando a pintura gasta do Kadet.
- E aí Edgar, viu como está ficando bonito meu carro?
- Isso vai dar trabalho hein, até tirar essas manchas da lataria.
- É, mas vale o sacrifício.
Fiquei na companhia de Chico por uns quarenta minutos, presenciando aquele autoflagelo, pois as manchas insistiam em não sair.

Pensando bem, acho que o flagelo maior era o meu, pois não conseguia compreender como podia um cara ter tanta satisfação numa coisa que nem dava pra chamar de bem material, enquanto eu que estava infinitamente em melhores condições financeiras, não conseguia me dar por contente. Sempre achava que me faltava algo.
Despedi-me de Chico e resolvi afastar-me dele por um tempo, até entender esse sentimento que me abatia.
Passado um tempo, encontrei pelas ruas o Zé Roberto. Ele me informou que no dia anterior, Chico havia sido roubado e espancado por um ladrão que estava encapuzado. O bandido o deixou quase desfigurado e em coma, ainda por cima levou seu carro e em seguida ateou fogo naquele que era o xodó de Chico.
Despedi-me de Zé Roberto e de repente me veio outra crise de espirro e a única coisa que me passava na cabeça era:
- Maldita hora em que fui usar aquele capuz!


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